Planos de saúde individuais e familiares da Unimed Ferj serão reajustados em 14,43% este ano, mais que o dobro do limite de 6,06% estabelecido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para esses contratos. É o segundo ano em que a operadora aplica aumentos “fura-teto”. Dessa vez, a justificativa é que a correção considera, além do reajuste máximo autorizado, um “percentual residual” de um acordo feito no ano passado com a reguladora, que autorizou um aumento além do limite para reequilíbrio econômico-financeiro da carteira. 

A medida extraordinária já constava do Termo de Compromisso de transferência das carteiras entre a Unimed-Rio e a Ferj estabelecido no início de 2024. Para reequilíbrio técnico-atuarial dos contratos individuais da operadora, foram liberados reajustes de 21,1%. 

A ANS, no entanto, limitou a aplicação do percentual a 20%, sob a justificativa de proteger os consumidores. Isso porque, no mesmo período, os contratos também estavam sujeitos ao reajuste anual, de 6,91%. A combinação dos dois índices (6,91% e 21,1%) resultaria em um aumento de 29,47%, o que foi considerado excessivo. 

Como o percentual foi definido?

O cálculo dos percentuais não deve ser feito por simples soma ou subtração, mas por juros compostos. Dessa forma, a limitação do reajuste a 20% no ano passado fez com que parte do percentual autorizado (os 21,1%) ficasse pendente para aplicação futura. Esse “resíduo” foi calculado em 7,89%, que será aplicado agora, em 2025, junto com o novo reajuste anual de 6,06%, chegando a 14,43%. 

O aumento acima do teto da ANS pegou de surpresa os usuários. Caso da pesquisadora Roni Filgueiras, que junto com as duas irmãs ajuda a custear o plano da mãe, Roni Maia, de 82. O contrato subiu de R$ 3.500 para R$ 4 mil.

— A má gestão da Unimed está sendo premiada pela ANS. É dividir o prejuízo com a carteira de clientes, isso não existe — protesta. 

A advogada Melissa Areal Pires, especializada em Direito Aplicado aos Serviços de Saúde e Direito do Consumidor, explica que o reajuste não é irregular, porque foi autorizado pela agência reguladora. 

— Mas entendo a justificativa como abusiva. Tudo depende, porém, de uma avaliação à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC) numa eventual judicialização do caso. Ainda assim, enfrentaria uma tese complicada pela decisão da ANS — analisa. 

Cobertura deixa a desejar

O aumento nas mensalidades não é o único ponto que incomoda os usuários. Entre as operadoras de grande porte, a Ferj lidera com o maior índice geral de reclamações (IGR). A métrica da ANS é calculada a partir do volume de queixas sobre o tamanho da carteira da operadora num determinado período. Somente em julho, foram 1.834 notificações feitas por usuários à agência reguladora. Desde janeiro, são 13 mil queixas, a maior parte delas relacionadas à cobertura. 

Enquanto a mensalidade pesa mais no bolso, usuários veem a rede credenciada reduzir. No caso mais recente, a rede Oncoclínicas deixou de atender usuários da Ferj neste mês de agosto, sem comunicação prévia da operadora, segundo os consumidores. Cerca de 12 mil pacientes da Ferj em tratamento de câncer eram atendidos na rede. 

Um dos afetados foi o médico aposentado Antonio Mizael Lustosa, que tratava um câncer de próstata com metástase na coluna numa das unidades conveniadas da Oncoclínicas. A esposa dele, a advogada aposentada Vaneida Pires, conta que não recebeu nenhum comunicado da Unimed, descobrindo no último dia 22 que a unidade de saúde deixaria de atender o plano do marido a partir de 1º de agosto. Juntos, eles desembolsam quase R$ 7 mil pela cobertura. 

Vaneida diz que foi orientada a ligar numa central telefônica da Unimed, mas não foi atendida. Depois, tentou atendimento via e-mail, enviando o histórico e exames do marido — até hoje sem retorno. 

Sem saber o que fazer, buscou atendimento Espaço Cuidar Bem, unidade oncológica própria da Unimed, inaugurada em Botafogo no último dia 28. No dia agendado para que ele recebesse a infusão, porém, o atendimento foi suspenso porque o tratamento não tinha sido entregue pelo fornecedor. A família segue sem informações de quando o tratamento do idoso, que precisa receber doses trimestrais da medicação, deve acontecer. 

— O atendimento na Oncoclínicas era maravilhoso, tínhamos uma equipe que acompanhava não apenas o Mizael, mas todos nós. O câncer é uma doença que atinge toda a família. Mas chegando lá, foi péssimo. O atendimento dele, que é trimestral, foi cancelado. Era um monte de gente, uma confusão — lamenta. 

O que diz a Unimed Ferj

Já segundo a Unimed Ferj, não houve descredenciamento, mas uma “repactuação contratual, sem interrupção abrupta de vínculo”, o que não obrigaria a operadora a cumprir o aviso prévio de 30 dias aos beneficiários, conforme previsto pela ANS, “por não se tratar de atendimento hospitalar”. 

“A transição dos atendimentos para o Espaço Cuidar Bem vem sendo conduzida com responsabilidade e cuidado. A comunicação com os pacientes foi iniciada no dia 28/07 por meio de canais diretos da Unimed Ferj e com todas as informações sobre a transição para a nova unidade, além de contato por telefone com os beneficiários incluídos no primeiro ciclo de atendimento”, afirmou a operadora, em nota.  

Já a Oncoclínicas disse que a Unimed Ferj anunciou a criação de um serviço próprio para atendimento oncológico, como parte da reestruturação de sua rede assistencial, e que a comunicação aos beneficiários foi conduzida pela operadora.  

Procurada novamente sobre o caso do aposentado Antônio Mizael, a Ferj ainda não respondeu. 

Em nota, a ANS ressaltou que os consumidores que não desejarem permanecer na Unimed Ferj podem trocar de operadora sem cumprir novos prazos de carência, desde que atendam às regras da portabilidade previstas na Resolução Normativa 438/2018. A agência disponibiliza uma cartilha com orientações e oferece, em seu site, um guia para comparar planos de saúde.

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